sexta-feira, 24 de maio de 2013

Making of - Dune II, o primeiro RTS



Traduzido pelo colaborador Henrique

É raro para um jogo se tornar o progenitor de todo um novo gênero. Embora tivesse seus precedentes, como alguns títulos 8 bit vagamente semelhantes, o primeiro jogo de estratégia em tempo real do mundo pode ser nomeado com pouca controvérsia.

Voltar a Dune II hoje em dia deixa bem claro do quão pouco o gênero evoluiu. O mesmo ponto de vista básico, interface, controles e jogabilidade de Dune II ainda estão sendo reutilizados hoje, com apenas poucos avanços evolutivos.

Abolindo as grades de quadrados e hexágonos de movimentação dos jogos de estratégia em turnos da época, Dune II foi livremente baseado no filme Duna de David Lynch , pelo menos em termos de design visual (que por sua vez é baseado no livro de 1965 escrito por Frank Herbert). O jogo tem três facções diferentes (uma inventada para o jogo), todas com estruturas, unidades e super armas individuais.

Embora seja difícil de entender hoje em dia, ser capaz de controlar cada unidade diretamente com o mouse - bastando apontar e clicar onde você queria mover ou atacar - foi revolucionário, assim como a criação da necessidade de coletar recursos (especiarias) para alimentar a expansão do seu exército.
"A inspiração para Dune II veio em parte de Populous, do meu trabalho em Eye Of The Beholder e a última e talvez mais importante parte veio de uma discussão que tive com Chuck Kroegel, então vice-presidente da Strategic Simulations Inc", lembra o co fundador da Westwood Studios e produtor de Dune II, Brett Sperry.

"O centro do meu argumento com Chuck era que jogos de guerra eram chatos por causa de uma falta de inovação e design pobre. Chuck sentiu que a categoria estava em um longo e lento declínio, porque os jogadores estavam migrando para os gêneros mais interessantes", explica.
"Eu sentia que o gênero tinha um grande potencial e estava pouco explorada, especialmente do ponto de vista de design. Por isso, tomei isso como um desafio pessoal e imaginei em como aproveitar a dinâmica em tempo real com excelentes controles em um jogo de guerra em ritmo acelerado".
O jogo de Mega Drive Herzog Zwei é frequentemente rotulado como uma inspiração primária para Dune II, mas de acordo com Sperry a maior influência veio de uma outra fonte.
"Herzog Zwei era muito divertido, mas eu tenho que dizer que a outra inspiração para Dune II foi a interface gráfica do Mac. O design / interface dinâmica de clicar o mouse e selecionar itens no desktop me fez pensar: 'Por que não permitir o mesmo dentro do ambiente de  jogo? Por que não um campo de jogo sensível ao contexto? Para o inferno com todas essas teclas de atalho, para o inferno com o teclado como o principal meio de manipular o jogo!"


A influência do MacOS (na época a interface de texto do MS-DOS ainda competia com o Windows em PCs) em Sperry é talvez pouco surpreendente dada a sua experiência na indústria de jogos inicialmente como um programador para Apple II.
"Eu comecei a programar na escola quando eu tinha 16 anos e, inicialmente, eu fiz ports para o Apple II, alguns apicativos e seis jogos educativos. Meu primeiro grande jogo foi chamado de Terra 12, mas nunca foi lançado. Em 1984 eu conheci Louis Castelo durante um port de Missão Impossível para o Apple II em que eu estava trabalhando. Louis fez a maior parte da arte e animação nesse projeto. Na verdade, depois de ver suas obras de arte digitais, vi que era o fim da minha carreira artística nos computadores! "
"Louis e eu fundamos a Westwood Studios, em março de 1985 como uma empresa de jogos de 16 bits. Nossos primeiros jogos foram para o Amiga e Atari ST. Éramos uma emprresa de três homens inicialmente, junto com o programador Barry Green. Louis fez toda a arte, nós três estávamos na programação e todos fizemos alguns trabalhos de áudio."
Sperry parou de programar em 1987, decidindo se focar no design dos jogos, na direção da nova empresa e na fiscalização da produção de todos os jogos da Westwood.
"Com o surgimento das máquinas de 16 bits, as regras e as normas mudaram drasticamente. Na verdade, tivemos que contratar dois artistas e um cara para o áudio. Quase de imediato a indústria passou de uma equipe de dois homens para um grande grupo em cinco ou seis anos."
Além de provar que algumas coisas na indústria dos jogos nunca mudam Sperry também lembra que, no mesmo período, ele estava ficando entediado com a programação:
"Para mim, conceitualização e design de jogo eram os trabalhos mais difíceis e mais emocionantes de todos e eu não queria deixar nas mãos dos outros essa parte."
A conceitualização do próprio Dune II começou com uma conversa com Martin Alper, presidente da Virgin Games.

"Martin perguntou o que eu pensava sobre os livros Duna de Frank Herbert e o filme", lembra Sperry. "Eu adorava os livros e eu amei o filme de David Lynch, eu disse. Martin me disse que tinha posse da licença e que eu poderia usá-la se eu quisesse”.
Na conversa Alper contou a  Sperry que a Virgin tinha trabalhado com a desenvolvedora francesa Cryo em um jogo que misturaria adventure e estratégia com a temática de Duna, mas havia sido cancelado. Mas Sperry iria descobrir mais tarde,  que a Cryo não tinha aceitado um não como resposta.
"Eles correram para terminar seu jogo antes de nós", revela ele. "O resultado foi um pesadelo - o jogo da Cryo não tinha nada a ver com o nosso e, no entanto, foi publicado primeiro porque a Virgin estava ansiosa pelos lucros. Apesar dos meus protestos violentos o nosso jogo foi renomeado para Dune II: The Building of a Dynasty [Battle For Arrakis na Europa e para a versão de Mega Drive] e o resto é história. "


O desenvolvimento inicial foi meio problemático, como Sperry conta:
"Joe Bostic era meu principal programador, e lembro-me de dizer-lhe sobre como eu queria que as unidades se movimentassem no campo de batalha e as noções básicas de combate. E assim ele colocava tudo junto, e o jogo resultante era muito chato! "
Nesta fase, porém, o jogo tinha pouca semelhança com o produto final, com apenas quatro a oito unidades de combate em cada lado.
"Quando jogamos ele, o fim foi muito rápido. Então, nós trabalhamos em obstáculos no campo de batalha e depois na dinâmica de produção, a base e a construção das unidades, e o efeito neblina de guerra. A dinâmica de produção foi parcialmente inspirada por Civilization e me deu idéias sobre como fazer Dune II mais interessante".
De acordo com Sperry não havia um game design pronto e o desenvolvimento foi em grande parte improvisado.
"Eu não era muito bom em traduzir o que eu via na minha mente", ele admite. "Eu sabia o que eu queria sobre os controles e interface de forma muito clara, mas algumas das dinâmicas de unidade ainda estavam obscuras. Então, basicamente construímos o jogo de forma interativa e o design do projeto foi feito à medida que avançávamos. "
Esta abordagem aberta do design do jogo é claramente como Sperry prefere trabalhar, admitindo que hoje ele passa mais tempo como um voyeur do que um jogador.
"Quando eu me concentro em ver os outros jogarem, eu aprendo mais sobre design de jogos e entretenimento, o que está funcionando, o que é frustrante e o que os jogadores estão dispostos a aturarem e por quê. Design de jogo e interação com o jogador ainda são uma fonte de fascínio sem fim para mim. "
Sperry descreve o principal desafio da produção de Dune II como "fazer uma combinação de combate, exploração e produção a um ritmo particular para fazer tudo emocionante e quase fora de controle. Isso foi uma parte fundamental de que o tornou tão viciante. "De fato, a experiência foi completamente diferente dos títulos de estratégia baseados em turnos mais sóbrios, onde o sucesso ou o fracasso vinham lentamente ao invés de correr sobre dunas de areia com a velocidade de um jogo de ação.


"Você tinha que pensar e responder rapidamente e em tempo real, ou então a sua base e forças seriam invadidas. E a medida que desenvolvia o jogo ainda mais, tornou-se claro de como o ritmo e design dos cenários de batalha tinham todos um equilíbrio delicado. "
Apesar da preocupação com o título obscuro o jogo foi um sucesso imediato quando lançado em 1992.
"Nós chamamos Dune II de uma 'estratégia em tempo real' - nós fizemos isso para deixar claro para os varejistas de software e usuários que tínhamos algo novo", diz Sperry, a quem que parece ter sido oferecida a rara oportunidade de não só criar um novo gênero mas nomeá-lo também. "Mas a alma era de um jogo de guerra. Você construía e gerenciava unidades e conquistava o outro lado. Depois que as pessoas experimentaram o jogo elas ficaram fascinadas e logo Dune II foi um grande sucesso comercial. "
Como o trabalho no jogo chegou ao fim, Sperry estava trabalhando em seu sucessor:
"Eu estava evoluindo meus projetos e descobrindo como otimizar a interface ainda mais. Eu tinha desenvolvido um novo jogo com uma temática moderna, e foi assim que Command & Conquer nasceu."


Apesar de Dune II ganhar duas continuações - um remake em 1998, chamado Dune 2000, e uma sequência mais bem aceita em 2001 Emperor: Battle For Dune - a série Command & Conquer é o verdadeiro legado do jogo. A série ainda é a mais bem-sucedida franquia de estratégia em tempo real  até hoje e sua dívida com jogos originais da Westwood é óbvia.


Sperry tem pouco a oferecer em apoio às franquias posteriores do gênero, no entanto.
"Os poucos jogos de guerra que eu joguei ultimamente tem me deixado sem inspiração", ele admite. "Eu realmente não vejo o gênero de estratégia em tempo real, como tal, portado em consoles."
"Dito isso, os jogos de hoje são muito divertidos e emocionantes para mim. Eu jogo World Of Warcraft com alguns amigos em um servidor PvP. Eu gostei de BioShock e eu ainda jogo Mario Kart as vezes. Principalmente os jogos sociais e jogos multiplayer me atraem. A qualidade dos jogos ainda é um “balaio de gatos”, apesar de toda a nova tecnologia. Mas não tem sido sempre assim? Na música, literatura e cinema, vemos a mesma coisa - muita oferta, mas um pequeno número de jóias emocionantes a cada ano. E posso garantir a vocês que, assim como outros entretenimentos, todos os projetos de jogos começam como algo novo e excitante na mente de seu criador. Mas, sem um grande projeto, feedback crítico e uma equipe sólida, ele ainda pode se tornar um resultado perigoso. "
Texto original: Edge

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